Muitos autarcas aproveitam os recursos financeiros das autarquias locais onde estão em posição maioritária para fazerem campanha eleitoral em proveito próprio.
Bem perto das eleições lá vêm boletins, revistas e outras publicações em papel de qualidade e profusamente ilustradas com as grandes e pequenas obras do regime, sempre ilustradas a cores e de preferência com a omnipresença do presidente da Câmara Municipal ou da Junta de Freguesia, sorridente e com ar esperançoso, muitas vezes acompanhados das forças vivas e de populares enebriados.
Aqui e além o Reverendo Cura, aspergindo com água benta as novas realizações, a banda filarmónica devidamente uniformizada, a par da guarda de honra dos Bombeiros Voluntários, formada a rigor e de capacetes e machados reluzentes, tudo num cenário que nos remete para “A Procissão”, de António Lopes Ribeiro, na genial versão musicada e declamada por João Villaret.
Apesar desta caricatura, os tempos evoluíram e muitos destes autarcas perceberam a máxima latina “panne et circenses”, verificando-se no último ano do mandato um reforço das festas e eventos financiados e organizados pela respectiva autarquia, a par das juras de amor às colectividades locais, untadas por gordos subsídios.
A evolução das formas de comunicação estende-se a outdoors apolegéticos da autarquia ou das gloriosas façanhas dos seus “queridos líderes” e, claro, o programa de televisão em que o presidente aparece com ar descontraído, de fato e sem gravata, a “vender” a qualidade de vida e vantagem competitiva do concelho. Também nas redes sociais as páginas de muitas autarquias mais parecem revistas cor-de-rosa, exibindo o Presidente e os autarcas da maioria nas mais diversas circunstâncias.
Tudo isto é feito com recurso a dinheiros públicos, sendo certo que a Comissão Nacional de Eleições tem estado atenta, com decisões a condenar várias destas práticas, algumas já confirmadas pelo Tribunal Constitucional, por violação da proibição dos deveres de neutralidade e imparcialidade e por violação da proibição de campanhas de publicidade institucional por entidades públicas.
O que é grave, em tudo isto, é que tudo se passa num esquema formalmente democrático, perante um generalizado sentimento de impunidade, ficando claro que “o crime compensa”. Este tipo de atitude é própria de regimes totalitários, podendo ser ilustrado pelo legado de António Ferro, propagandista de Salazar, ou dos propagandistas de Estaline. O que é certo é que em muitas autarquias, as teias de poder local, são de tal forma intensas, que estas práticas resultam. Cabe a si, cidadão eleitor, tomar posição e responder a isto, em nome da decência democrática.
Artigo de Rui Costa, Advogado, ex-vereador a deputado municipal em S. Pedro do Sul, mandatário da candidatura e candidato do Bloco de Esquerda à Assembleia Municipal de Lisboa nas autárquicas 2017. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
Este artigo foi publicado no “Jornal do Centro” a 15 de setembro de 2017 e republicado no portal Esquerda.net.
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